terça-feira, 1 de julho de 2008

Encontro adiado



Escrevi este conto que partilho convosco...

Soltou um suspiro de alívio. Tinha escapado por pouco a um terrível aguaceiro! Despiu a gabardina preta, e desvendou a silhueta feminina no vestido justo.
Escolhe uma mesa perto da janela de modo a observar o que se passa lá fora e espreita as gotas, pingos de chuva que não pára de cair. Imagina a expressão das pessoas debaixo dos chapéus. Desiludida, alegre, sonhadora? Quase ouve o barulho do vento e dos passos apressados quando encontram pequenas poças de água. As buzinas dos carros irritados com o trânsito. Uma tarde agitada também por causa do temporal…
“Não vou pedir já. Estou à espera de uma pessoa”. Esboçou um sorriso tímido, pouco convincente.
Dentro de si, as nuvens cinzentas parecem querer tapar o pouco sol que lhe resta.
O telemóvel, em silêncio, mostra as horas. Poderia experimentar ligar-lhe mas iria apenas demonstrar a insegurança que sentia. E depois, atendendo ou não, estava certa que só ficaria ainda mais magoada. E se estivesse desligado?
Tirou um livro da mala vermelha, embora soubesse que naquele momento este serviria apenas como um mero acessório. “Como o acaso comanda as nossas vidas” de Stefan Klein. Pensou na presente situação. Será que corresponde mesmo à verdade?
Se calhar era boa ideia pedir alguma coisa. “Uma torrada e um chá de maçã canela, por favor”. Bebeu um gole do chá e trincou o pão.
Esta espera, e a sua incapacidade de tomar uma atitude ou decisão estavam a deixá-la frágil e vulnerável. Como se o Mundo tivesse parado ou se virasse contra ela. Limpou a lágrima que lhe rolava pelo rosto.
Procura estar atenta aos outros clientes. Por detrás da aparência o que poderá ser revelado? Ao fundo, um grupo de adolescentes parece hilariante, com imensas histórias loucas para contar. Falam todos ao mesmo tempo, sem facilitar o diálogo. De repente, levantam-se e saem. A casa de chá começa a ficar deserta. Parece que só resta mesmo ela!
“Desculpe, mas vamos ter de fechar. Está tudo bem consigo?”
“Sim, claro, estava distraída! As minhas desculpas”
Abriu a porta, olhando o anoitecer. Pelo menos a chuva tinha parado e havia uma nesga de azul.

1 comentário:

O Espírito do Tai Chi disse...

Gostei imenso. Revelador de uma observadora da vida. Não apenas uma "passageira".
Parabéns e beijinho,

António Serra